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Assim como Niki Lauda e James Hunt duelavam nos circuitos de Fórmula 1 — o que a arte cinematográfica registrou em “Rush – No Limite da Emoção” —, Giuseppe Chiovenda e Francesco Carnelutti travaram célebres disputas intelectuais no terreno do Direito Processual Civil. Sem que houvesse ranking ou distribuição de troféus, os italianos inflaram de prestígio acadêmico e reconhecimento jurídico a antes secundária disciplina processual.

Todavia, diferentemente do que se sucede na maioria dos enfrentamentos esportivos, no silêncio dos motores cognitivos os pensamentos não são laureados com vitórias ou destronados com derrotas. O campeonato da conflagração de ideias, muitas vezes, é decidido com a adequação de uma tese a outra, mesmo entre teorias antagônicas.

Com efeito, tamanha a excelência dos conceitos e sistemas sustentados por Chiovenda e Carnelutti que os processualistas do seu tempo e do futuro, que se fez presente, quiseram estabelecer sua convivência harmônica num mesmo ordenamento jurídico nacional. Por maiores que sejam seus talentos, ainda que se tratem de espíritos de escol, vocacionados à evolução do direito e da processualística, é imprescindível que alguém se porte como um chefe de escuderia e aponte aquele a ser priorizado pela equipe em busca do título de campeão.

Chiovenda desenvolveu sua doutrina sobre um axioma máximo: definiu processo como o “complexo dos atos coordenados ao objetivo da atuação da vontade da lei (com respeito a um bem que se pretende garantido por ela), por parte dos órgãos da jurisdição ordinária”. Da nossa discreta posição, espectador de um autêntico “Grand Prix de Processo Civil”, enxergamos que Chiovenda entendia o processo como o reino para o império da lei. O que está na lei é o direito que deve ser dito, e assim se terá a jurisdição — do latim juris, direito, e dictio, dizer (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 2000, vol. I, p. 67).

Já para Carnelutti, a missão do processo é a justa composição do conflito de interesses, como “meio para a proveitosa convivência social”. O ideal soberano do processo é, enfim, a dissolução da lide, inclusive pelo uso da força, se necessário, mas alvejando a paz social pelo expurgo do “gene antissocial” que os litigantes portam entre si. (CARNELUTTI, Francesco. Sistema de Direito Processual Civil. São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, vol. I, p. 371).

A tentativa que conduzir ambos os fundamentos teóricos ao topo do pódio pode vir a agradar todos os fãs do Direito. A compatibilização de pensamentos tão distintos está evidente no processo moderno. Concebemos um Frankenstein de causar inveja a Mary Shelley. De um lado o esforço para se alcançar o consenso conciliatório entre as partes. Esgotados tentames por um acordo, aplica-se o rigor da lei. São notórios os desastres dessa montagem de peças automotivas que horrorizam a engenharia de materiais. Não há lógica em se curvar a um rápido consenso que leve à solução do litígio e firme a paz entre os antagonistas, quando, por mais que se deem longas voltas na pista processual, é altamente compensador o prêmio indenizatório com que o vencedor será galardoado.

Se o ofício jurisprudencial estiver desvencilhado da paz social, teremos a deflagração da agressividade judicial. Aliás, já temos. Eis uma relação inversamente proporcional de fácil entendimento ― maior a pacificação, menor a litigiosidade; menos paz, mais litígios em juízo.

A atuação da vontade concreta da lei, com todo o respeito, é tarefa que cabe ao Processo Penal. De passagem, qual um zunido veloz pelo guardrail, trafegamos pela matéria penal. Ela, sim, consiste na ultima ratio, incidente em situações em que o Estado intervém na sanção de comportamentos intoleráveis. Não obstante, na vez do “Grand Prix de Direito Penal”, num duelo à semelhança de Alain Prost e Ayrton Senna, o torcedor só pode escolher um corredor nas fileiras do funcionalismo penal. Não há meio termo: entre os alemães Claus Roxin e Günther Jakobs, deve-se preferir o princípio da insignificância defendido pelo primeiro ou vibrar pela teoria do direito penal do inimigo encabeçada pelo segundo.

Precisamos, com a mesma urgência de um piloto, definir qual a missão do Processo Civil, ou do próprio Direito. E, após um breve pit stop, se todas as considerações nos dirigirem à conclusão de que a prioridade vocacional da ciência jurídica está em evitar graves acidentes que interfiram na human race, mantendo a convivência social, planificando e preenchendo os aclives e fendas das múltiplas leis que se sobrepõem e desagregam no irregular asfalto normativo, haveremos de tomar uma clara decisão: dar a bandeirada final em favor de Francesco Carnelutti.

Se assim concordarmos, assumamos o apressado e corajoso compromisso de tratar coerentemente os institutos que orbitam nos embates processuais, de modo que zelo pela conciliação, minoração das indenizações (por dano moral), desestímulo à judicialização e redução da litigiosidade tenham o processo na largada e a paz social na chegada. Pelo bem da humanidade, parece que o destino do Direito ― seja Penal, seja Civil, se ainda houver quem sugira tal dicotomia ― já estava traçado desde os treinos oficiais do Direito Romano: em prol da vida em sociedade, minimis non curat praetor; o magistrado não cuida de minudências ou questões insignificantes. Tampouco deve indenizá-las quando direitos da personalidade ou de outra ordem sequer são arranhados.

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Fatores complexos contracenam na efetiva construção de um Estado Democrático de Direito. Muitas nações exibem esse rótulo; no entanto, se concebermos um certificado de excelência em justiça, bem poucas serão dignas do honroso título. Um estudo comparado do colorido tingimento do Poder Judiciário, e dos indicadores que interferem na afirmação das liberdades públicas e das garantias fundamentais, representa uma pintura dos desafios com que a sociedade civil se depara para reduzir a distância entre a teoria e a prática do Direito.

O cotidiano multicultural do continente americano é, por si, um caleidoscópio em constante reelaboração. A tarefa de agrupar as interações que resultam no produto da justiça consiste num trabalho de seleção, e não de coleção. Quem disser que logrou o mapeamento completo dos índices de concretização da justiça num bairro periférico será um apressado aventureiro. Dia após dia surgirão dados antes esquecidos que provocam considerável impacto sobre as certezas da pesquisa.

No despretensioso panorama ora apresentado, colhemos informações disponibilizadas pelo Centro de Estudos de Justiça das Américas – CEJA, referentes a alguns países nos anos de 2007 a 2009. Dados mais abrangentes e recentes são escassos ou demandam investigação mais apurada, especialmente quando o Judiciário se revela o reduto menos permeável ao conhecimento do cidadão. Para uma rápida ilustração, o Programa de Transparência Pública, implementado pela Fundação Getúlio Vargas, obteve em 2014 resultados alarmantes sobre o desempenho do Judiciário brasileiro, compilados na publicação “Estado Brasileiro e Transparência ― Avaliando a Aplicação da Lei de Acesso à Informação”. Pode-se ler que “em reiterados casos os pedidos de acesso à informação foram indeferidos pelos tribunais com base em uma interpretação ampliativa e ilegítima das exceções legais”.

De todo modo, sigamos aos primeiros números selecionados e reunidos pelo CEJA. De início, temos a confirmação de uma singular dedução empírica que preponderou nos debates de alto nível travados na CAW Diálogos ― especialmente nos posts “A ‘Desjudicialização’”, “As Ações Cautelares de Exibição de Documentos – O Sistema de Sobrevivência de Uma Classe”, “Um Mundo Sem Graça Nenhuma” e “Ainda sobre a Desjudicialização dos Conflitos”, dos eméritos Drs. Márcio Aguiar e Fernando Corbo. Há uma lógica e estreita relação entre (poucos) juízes, (inúmeros) advogados e (muitos) litígios.

Ainda é de se destacar o crescente backlog de demandas sem encerramento definitivo. No grupo de países latino-americanos analisados, a média de resolução de conflitos (jurisdição contenciosa) e de chancela judicial de interesses comuns (jurisdição voluntária) atinge 89,54% das ações que ingressam no mesmo ano pelas portas do distribuidor judicial. Não obstante o progressivo acúmulo de 10,46% dos processos dos anos anteriores ― na mais linear e lisonjeira perspectiva ―, mostram-se fartos os orçamentos disponibilizados às Justiças da América Latina, sendo em alguns países um estimável percentual da receita, legal ou constitucionalmente prefixado.

Sob outro aspecto, a partir da medição de seis dimensões de governança, as instituições forenses foram avaliadas por 12.297 dos principais líderes de gestão de negócios em 134 países. Da pesquisa, encomendada pelo Fórum Econômico Mundial, extraiu-se um indicador da percepção da independência do Judiciário com relação a influências políticas dos membros do governo e do parlamento, dos cidadãos ou das empresas.

O Consórcio Latino-americano de Consultoria Market Research, por sua vez, focou sua pesquisa no diagnóstico de outra percepção. Se todos os índices apresentados pudessem ser reunidos em apenas um, que representasse um balanço geral do Poder Judiciário, provavelmente seria o indicador da confiança da população local na Justiça de seu país. A atuação de juízes e tribunais é contextualizada pela crise financeira global, pelo grau de satisfação com a democracia, pela performance dos chefes de Estado em questões relativas a segurança, desemprego, corrupção, relações internacionais etc. Certamente, os pomposos recursos alocados no Judiciário também são sopesados na expressão numérica do nível de (des)atendimento do sentimento de justiça do cidadão.

Se o Direito deve ser aplicado aos fatos, os fatos têm muito a dizer sobre o Direito. Eis, assim, uma sorte a mais de elementos para nossas próprias conclusões a respeito da justiça que temos, a par daquela que idealizamos.

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Riscamos estas linhas em admiração ao texto do caro amigo Corbo. Os temas se beijam ― respeitosamente. A falência dos meios judiciais nos faz especular: qual a razão de ser do Direito? A questão se encrespa, especialmente, quando tratamos do processo ou da fase de execução. A lassidão da pesada máquina forense nos recorda a obesidade de um pavão. Arrasta sua ostentadora plumagem sem oferecer muitos benefícios para a comunidade. Por mais exagerado que seja o pássaro exibicionista, bem que poderia emagrecer e deixar os palacetes do Judiciário. Seria melhor esticar a cauda e balouçar uma nova justiça.

No início da obra “Nos Confins do Direito”, de Norbert Rouland, são citados exemplos que melhor ilustram o que tentamos transmitir. Refere-se a três sociedades empresárias da Espanha, criadas em 1989, cujos serviços de cobrança se diferenciavam pela originalidade e seus traços de humor. Confiantes na força do ridículo, perseguia-se o devedor com uma fantasia de pantera cor-de-rosa a carregar uma maleta na qual se lia “Recebimento de Dívidas em Atraso”. Ora se apresentava um personagem trajado como um aristocrata do século XVIII, vestindo casaca e cartola. A cena se repetia nas vias públicas da Andaluzia, Barcelona e Madri, percebendo-se um inadimplente apressado, seguido de perto no caminho para casa, para o escritório, para um restaurante… Cedo ou tarde a dívida era paga pelos meios psicológicos da humilhação. Pesados na balança, o prato da propriedade aviltada, pelo descumprimento da obrigação, vencia o da dignidade, violada para atender a um fim moral.

A coerção, nome emplumado para a força do direito, já não instila o temor de antes. Os cinco continentes já experimentaram absolutismos ou ditaduras, e a flexibilidade do direito, retorcido para todos os lados, lhe afetou a integridade, a austeridade, a intimidação. É preciso resgatar o sentido do Direito desatrelado do Estado. À medida que a engrenagem estatal pede lenha e óleo na forma de cargos e tributos, suas molas e parafusos saltam rangidos de ineficiência para normatizar, fiscalizar, executar e decidir. A solução é simples: economizem lenhas, óleos, molas e parafusos. Teremos menos ônus e mais liberdade, já que o garantismo estatal se revelou, em pouquíssimo tempo, um exuberante viveiro aberto de espécies raras ― nenhuma ave sairá nem tem a pretensão de voar; visitantes são aceitos apenas para assistir e muito alimentar.

Entre pavões corpulentos, panteras coloridas e cartolas ao vento, vejam aonde o ridículo me levou!

A monografia em Antropologia Social de Mrs. Sybille Van der Spenkel, apresentada em 1962 à Universidade de Londres, guarda preciosa informação sobre curioso decreto expedido no século VII pelo imperador chinês Hang Hsi. A aplicada autora da obra “Instituições Judiciárias na China Manchu” viveu na grande república oriental de 1948 a 1950 e colheu dos alfarrábios da China Imperial a determinação soberana que se segue:

“Ordeno que todos aqueles que se dirigirem aos tribunais

Sejam tratados sem nenhuma piedade

Sem nenhuma consideração,

De tal forma que se desgostem tanto da ideia do Direito,

Quanto se apavorem com a perspectiva de comparecer perante um magistrado.

Assim o desejo para evitar que os processos se multipliquem assombrosamente.

O que ocorreria se:

Inexistisse o temor de se ir aos tribunais.

O que ocorreria se:

Os homens concebessem a falsa ideia de que teriam uma justiça acessível e ágil à sua disposição.

O que ocorreria se:

Pensassem que os juízes são sérios e competentes.

Se essa falsa ideia se formar, os litígios ocorrerão em número infinito

E metade da população será insuficiente para julgar os litígios da outra metade.”

Pois bem, desde 2000, uma comissão de juízes do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro mantém intercâmbio com os Tribunais Superiores de Beijing e Shangai, e busca entender o sistema judiciário chinês, cuja filosofia prescreve, em casos de condenação à morte, que a família do penalizado seja obrigada a indenizar o Estado pelo gasto com a bala disparada na nuca.

Talvez o que os magistrados cariocas realmente queiram da grande nação asiática seja uma maneira de refrear o acesso ao Judiciário “até nas coisas mais banais”, como diria Cazuza. Não que a saída ideal passe pelo terror psicológico proposto por Hang Hsi, mas há alguma lição que a ordem decretada à época do direito da força reserva para os novos tempos da força do Direito.

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Há muitos “cawsos curiosos” que inicialmente são hilários; e, no fim de tudo, podem se mostrar chocantes! Mas não deixam de ser curiosos… Por isso contamos.

É uma manhã, final de fevereiro, ano de ‘92. Stella Liebeck, 79 anos, decide se aquecer com um copo de café. Está em Albuquerque, cidade do Novo México. Paga 49 cents no drive-thru do McDonald’s. Seu neto Chris, que dirige o carro, estaciona. Stella quer seu café com creme e açúcar. Tenta retirar a tampa. Seu arrependimento é tardio. O café, fervendo, se esparrama sobre o colo.

Calças encharcadas, queimaduras de terceiro grau, 6% do corpo atingido. Oito dias de internação, dois anos de tratamento, várias cirurgias de enxerto de pele, sequelas permanentes. Despesas médicas de 11 mil dólares.

Entra em ação Reed Morgan, advogado do Texas. Fundamento do pedido de indenização: café “excessivamente perigoso”, “defeito de fabricação”, “negligência grave”. Proposta de acordo de 20 mil dólares; contraproposta, 800 dólares.

O júri ouve as argumentações. Sua competência está assegurada na Sétima Emenda à Constituição americana. Reed sustenta. Café muito quente, temperatura imprópria, boca e garganta em perigo, urgente reavaliação termodinâmica da bebida! A rede de fast food se defende. Perigo óbvio, advertência na embalagem, calor para preservar sabor e aroma, temperatura recomendada pela Associação de Café estadunidense, índice de acidentes “estatisticamente irrelevante”, vitória em 13 ações judiciais semelhantes.

17 de agosto de 1994 ― o júri bate o martelo. Princípio da negligência comparativa na prática: 80% de responsabilidade do McDonald’s pelo incidente; 20% de Stella. Indenização compensatória fixada em 200 mil dólares, minorada proporcionalmente para 160 mil. Ainda não está terminado: deve haver um desestímulo a práticas de risco a consumidores. Indenização punitiva estabelecida. Os 49 cents pagos pelo copo de café rendem dois dias da receita do restaurante com vendas da mesma bebiba. Em moeda corrente: 2,7 milhões de dólares. O juiz Robert Scott preside o júri e reduz a indenização punitiva. A esse título, as cifras caem para 480 mil dólares ― três vezes a indenização compensatória. Valor final: quentes 640 mil dólares.

O veredicto está dado. Na ampulheta, escoam dois dias. Para um café pelando, esperam-se apelações. Sem recursos, as partes se encontram. Acordo firmado, valores não revelados.

Mais 8 anos escoam lentamente. É lançado o Stella Awards. Não é prestígio; apenas galhofa. O prêmio é divulgado pelo site do humorista Randy Cassingham, colunista de jornais americanos. Escarnece das decisões judiciais representativas da “litigância frívola”.

Chega o dia 4 de agosto de 2004. Stella Liebeck falece aos 91 anos de idade. Após os boatos mergulhados em fatos, Cassingham reconhece que “grande parte da cobertura sobre o caso de Stella foi extremamente injusta”…

Após muitos cafés servidos, estreia na HBO o documentário Hot Coffee, em 27 de junho de 2011. Susan Saladoff dirige a série e relança a discussão sobre a necessidade de reforma do sistema americano de arbitramento de indenizações.

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O princípio da inércia ou da demanda, que norteia a atividade do Judiciário, estabelecendo que “nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando provocado na forma da lei” (art. 2º, CPC), parece aprisionar o juiz. Ele deve proferir uma decisão, mesmo contra a sua vontade. De fato, não poderá se eximir de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei, já diz o texto do Código de Processo Civil (art. 126, CPC). A lei não dá margens: o juiz deve decidir.

O resultado disso, porém, não há de ser uma postura passiva dos juízes. Para que a jurisdição seja valorizada, é imperioso dissuadir o que se convencionou chamar de “aventuras jurídicas”. A Justiça deve ser enfrentada como última tentativa de solução do conflito. Não há nada de novo nessa ideia; sua formatação teórica mais feliz, a nosso ver, coube a Enrico Tullio Liebman, o italiano radicado no Brasil, que construiu a famosa “teoria eclética da ação”. Sob a ótica de Liebman, a sentença de mérito somente seria obtida se demonstrada a presença dos pressupostos processuais e das condições de ação.

O que nos interessa no presente raciocínio trata-se da condição da ação resumida na expressão “interesse de agir”. Por meio desse requisito, o autor teria que demonstrar a necessidade e adequação na utilização da ação judicial, para então poder usufruir da atividade do juiz. Seria, então, um justo obstáculo que o demandante haveria de vencer, mostrando terem sido frustradas as tratativas para resolver o impasse antes de tratá-lo como uma mera demanda judicial.

Desse modo, seria honrado o trabalho do juiz, cuja complexidade é pouca notada diante da espessa neblina que é soprada sobre as portas dos fóruns do Brasil afora. Sem nos prolongamos muito na abordagem teórica do assunto, ainda cabe enxergar que o ilustre processualista acolhido em nossas terras ainda propunha que as ditas condições da ação deveriam ser comprovadas pelo autor (teoria da exposição ou apreciação).

No entanto, em lugar dessa concepção bastante razoável, que vê na jurisdição a última alternativa a ser experimentada, vigora nos tempos atuais a teoria da asserção: as condições da ação são apreciadas conforme a narrativa feita pelo demandante. Basta a alegação do preenchimento de tais condições, sendo dispensada a sua comprovação. A resposta da sociedade para essa aparentemente simples opção processual está no oportunismo e na banalização da Justiça, de que o cotidiano forense dá inúmeras provas.

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O Ministério Público do Trabalho ajuizou ação civil pública pleiteando que a FIFA introduza mudança nos jogos da Copa. O MPT quer pausas durante as partidas, além do intervalo regular entre os dois tempos de jogo, para que os atletas possam tomar água. Aqui está em questão a forma e a oportunidade de agir do MP.

É claro que o desgaste físico faz parte do esporte. As competições esportivas têm em sua natureza o ranger dos limites físicos dos atletas. Não é por outro motivo que a equipe alemã treina, na Bahia, no calor do meio dia, no campo ensolarado e na academia sem ar refrigerado.

As olimpíadas de inverno são disputadas no rigor do frio congelante. Vencer o adversário também é vencê-lo fisicamente e nas condições climáticas eleitas e aceitas.

As competições de MMA, esporte mais próximo da estupidez humana, deveriam receber, segundo os critérios de proteção e cuidado institucionais, o mesmo exercício de preocupação do MPT.

Regras internacionais do futebol não precisam ser modificadas coercitivamente no meio de uma competição mundial.

Quem convive com o exercício das questões judiciárias no Brasil sabe que há vaidades midiáticas.

A questão é, toda, a judicialização nociva dos interesses. Por que o MPT não propôs tais medidas há muito mais tempo?

A cultura brasileira dos conflitos de interesse é a do uso primário do Poder Judiciário. É forte a influencia do pensamento favorável à ação judicial como ferramenta fundamental do exercício da cidadania, como se não tivesse valor o uso de todos os outros meios não judiciais para resolução de divergências.

Pelos motivos mais do que conhecidos, já passou da hora de modificar essa cultura da judicialização. E não seria demais supor que os paradigmas de uma desjudicialização se fizessem presentes, primeiro, no campo dos exercícios funcionais dos Órgãos Ministeriais Brasileiros.

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