Procuro avidamente por um cientista do Direito. Não me contento com quem me aponte normas; tecnologia e vade mecuns atendem com louvor essa tarefa. Não quero quem me recite constituições ou codificações; nelas não há poesias que instruam e pacifiquem os povos; apenas ideologias e sectarismos trajados de comandos e sanções.

Não me incomodo que se vista de terno, toga, bata, burca, hábito ou donka de monge. Sua nudez não me constrangeria. Seja o que cobrir ou desvestir seu corpo, sua humilde lucidez deve estar aberta, livre de amarras ou de fios discriminatórios. Clamo por alguém que, para alumiar sua razão, não se incomode com a queimadura no fogo que acende o clarão.

Perdoem-me a pública seleção. Estou atônito desde que matamos Deus e o substituímos pelo Estado na moderna civilização. Não pretendo resgatar a deidade que amortalha a liberdade e considera espúria toda luta evolutiva. Estou cansado da divindade que revê suas posições a cada encíclica, que encarrega religionários de balançarem calendários e apontarem o dia do fim dos tempos, ou que ainda balança proezas arquitetônicas por sectários encarregados de explodirem vidas.

Busco quem substitua o Estado e suas políticas econômicas pela consciência. Quem resgate ao indivíduo o direito e não me repita que o poder emana do povo ― pois a lógica mais sensata vê nessa expressão a suprema apologia à anarquia. A pessoa a quem me refiro não vive reclusa nem santa é. Caminha por vales tenebrosos de penúria e marginalidade. Sobe aos píncaros das galhardias sociais. Investiga os acidentes geográficos dos sistemas políticos e econômicos. Perpassa a lei que rege os malfeitores. Percorre os sôfregos canais de conflitos policiais. Recusa-se a conceber o direito como vacina de controle social, tampouco como arma de extermínio radical de desejos, esperanças, anseios.

Procuro quem tenha encontrado o nada e nele tateou um direto órfão. Sem pai divino ou estatal, sem escolhas socialistas ou apupos ao capital. Quem viva o que diz, aplicando a si próprio a ciência a que se dedica. Alguém que não seja senhor nem escravo das ideias. Foragido da nobreza e da subserviência, vasculha a justiça, sem pressa, na poeira que encobre o barro e no brilho cintilante da bandeja de prata.

Tenho batido nas portas erradas. Admito. Juízes estão por demais encastelados. Cortes e suas barreiras de mármore e granito sequer ecoam os murros de aflição. Mas não farei do desespero minha melhor companhia. Vou me aventurar por outros territórios. As tribos têm seus bárbaros, mas quem não os têm. Talvez ali encontre um dócil e inocente curumim, explorador do assobio e dos rios, um estudioso amante da vida e da capacidade de fraterna cooperação entre mulheres e homens, quase de costas para o mundo. Talvez já esteja idoso, face a face com a morte. Vocês têm um nome a sussurrar? Essa geração pode não conhecê-lo. Salvo se nos encorajarmos a sê-lo.