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Todo litígio é custoso, imprevisível e ineficiente. As evidências falam por si. Se ainda pairar alguma dúvida, imaginamos que talvez ela recaia sobre a ineficiência. Mas não há como resistir: os mais inveterados processualistas já admitem que a Justiça não estabelece o fim do litígio; apenas aplica o Direito. Em geral o conflito de interesses persiste, a se ver das execuções que não são cumpridas e das mágoas que não sofrem o efeito da prescrição.

Não obstante, por mais que todo litígio seja um estorvo, não há atividade econômica que guarde distância de disputas judiciais. E o ardiloso paradoxo dessa conclusão está na desejada rentabilidade de qualquer negócio e os prejuízos certos de todo litígio.

Para as grandes corporações, os custos do enfrentamento judicial desfilam desde os honorários advocatícios ao destacamento de um funcionário produtivo para procurar documentos, prestar depoimentos, debater estratégias de defesa. Para as sociedades empresárias menores, ainda se soma algum elemento emocional desviando a atenção da atividade que constitui sua própria razão de ser.

Em 2004 a Associação de Advogados dos Estados Unidos publicou no 27º Fórum de Franchising o opúsculo “O Papel da Análise de Riscos no Gerenciamento de Disputas e Litígios” (tradução livre). Reportando-se ao caso Broussard v. Meineke Discount Muffler Shops, Inc., et al., os autores afirmam que, a depender do confronto deflagrado em juízo, os empresários evitam perseguir novas oportunidades de negócio e temem uma mudança de conduta até o julgamento ou liquidação dos valores discutidos.

Em meio a essa confluência empresa-processo judicial, a relutância dos advogados em avaliar os riscos jurídicos redunda em custos de litígio superiores ao valor do bem ou direito disputado. Outro sintoma são os graves e irreparáveis danos às relações comerciais entre as partes. A militância passional das causas do cliente, e o abismo entre a linguagem dos tribunais e a dos negócios figuram na origem dessas mazelas.

Os norte-americanos já atingiram a dupla conclusão de que o consenso entre os litigantes é o mais razoável desfecho de um processo judicial e que um acordo entre os contendedores é mais benéfico que a continuidade dos litígios. Segundo Marc Galanter, na esmiuçada pesquisa “Julgamentos em Extinção: um Exame dos Julgamentos e Questões Conexas nas Cortes Federais e Estaduais” (tradução livre), os tribunais americanos cada vez julgam menos ― a despeito da avalanche de demandas:

julgamentos_de_causas_cíveis_pelas_cortes_distritais_americanas

Está superada a ideologia defendida por quem ingressa em batalhas com a única pretensão de vencer. “Só me importa ganhar” é incompatível com a análise dos riscos e com o controle dos impactos negativos do processo. A situação se agrava à vista da realidade de muitos advogados no Brasil: um certo grau de desconforto com a aritmética. Em contrapartida, a gestão dos riscos jurídicos responde quanto e onde investir à frente de um litígio, pautando-se por quantificar realisticamente e comunicar significativamente os custos da demanda.

O gerenciamento do litígio exige a combinação de esforço e prática. E ainda requer o manuseio de uma ferramenta fundamental: the decision tree. A árvore de decisão revela os possíveis resultados de uma ação judicial e auxilia a avaliação dos custos, riscos e benefícios de cada resultado. Sinaliza as múltiplas e possíveis saídas financeiras de qualquer litígio. Os julgamentos subjetivos do corpo jurídico são traduzidos em termos monetários, objetivos, dispersando as nebulosas interpretações jurídicas.

árvore_de_decisão_em_4_etapas

Mais que intuição, a análise dos riscos reclama uma estratégia cuidadosa e sistemática do caso, desconstruindo a complexidade do processo em pequenos percursos que levam a possíveis resultados, até a pavimentação do caminho para a tomada das decisões adequadas.

Como principal insumo para a gestão de riscos, a capacidade de prever e estimar a probabilidade dos eventos-chave e dos valores implicados nos resultados finais depende da experiência e da percuciência do advogado. A clareza do relatório produzido conduz os clientes a uma rápida viagem – client ridealong. Concede-se ao cliente a entrada ao mundo jurídico, que se torna compreensível pela linguagem universal das implicações financeiras.

Cada torção no caminho do litígio pode surgir com a participação do próprio cliente na visualização das alternativas para o desenlace da disputa judicial. As informações atraídas pela gestão participativa dos riscos jurídicos criam novas perspectivas sobre o caso e conferem uma legitimidade estratégica à atuação do advogado, e não apenas intelectual.

Os tomadores de decisões são movidos por números. À retórica deem a tribuna. E a gestão dos riscos demonstrará que cada caso rigorosamente avaliado, com a devida documentação da lógica subjacente às recomendações do escritório de advocacia, com a clara apresentação dos efeitos da variação das suposições previstas, terá reflexos no baixo custo do litígio e na lógica que acena para a sua resolução sem postergação.

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Há muitos “cawsos curiosos” que inicialmente são hilários; e, no fim de tudo, podem se mostrar chocantes! Mas não deixam de ser curiosos… Por isso contamos.

É uma manhã, final de fevereiro, ano de ‘92. Stella Liebeck, 79 anos, decide se aquecer com um copo de café. Está em Albuquerque, cidade do Novo México. Paga 49 cents no drive-thru do McDonald’s. Seu neto Chris, que dirige o carro, estaciona. Stella quer seu café com creme e açúcar. Tenta retirar a tampa. Seu arrependimento é tardio. O café, fervendo, se esparrama sobre o colo.

Calças encharcadas, queimaduras de terceiro grau, 6% do corpo atingido. Oito dias de internação, dois anos de tratamento, várias cirurgias de enxerto de pele, sequelas permanentes. Despesas médicas de 11 mil dólares.

Entra em ação Reed Morgan, advogado do Texas. Fundamento do pedido de indenização: café “excessivamente perigoso”, “defeito de fabricação”, “negligência grave”. Proposta de acordo de 20 mil dólares; contraproposta, 800 dólares.

O júri ouve as argumentações. Sua competência está assegurada na Sétima Emenda à Constituição americana. Reed sustenta. Café muito quente, temperatura imprópria, boca e garganta em perigo, urgente reavaliação termodinâmica da bebida! A rede de fast food se defende. Perigo óbvio, advertência na embalagem, calor para preservar sabor e aroma, temperatura recomendada pela Associação de Café estadunidense, índice de acidentes “estatisticamente irrelevante”, vitória em 13 ações judiciais semelhantes.

17 de agosto de 1994 ― o júri bate o martelo. Princípio da negligência comparativa na prática: 80% de responsabilidade do McDonald’s pelo incidente; 20% de Stella. Indenização compensatória fixada em 200 mil dólares, minorada proporcionalmente para 160 mil. Ainda não está terminado: deve haver um desestímulo a práticas de risco a consumidores. Indenização punitiva estabelecida. Os 49 cents pagos pelo copo de café rendem dois dias da receita do restaurante com vendas da mesma bebiba. Em moeda corrente: 2,7 milhões de dólares. O juiz Robert Scott preside o júri e reduz a indenização punitiva. A esse título, as cifras caem para 480 mil dólares ― três vezes a indenização compensatória. Valor final: quentes 640 mil dólares.

O veredicto está dado. Na ampulheta, escoam dois dias. Para um café pelando, esperam-se apelações. Sem recursos, as partes se encontram. Acordo firmado, valores não revelados.

Mais 8 anos escoam lentamente. É lançado o Stella Awards. Não é prestígio; apenas galhofa. O prêmio é divulgado pelo site do humorista Randy Cassingham, colunista de jornais americanos. Escarnece das decisões judiciais representativas da “litigância frívola”.

Chega o dia 4 de agosto de 2004. Stella Liebeck falece aos 91 anos de idade. Após os boatos mergulhados em fatos, Cassingham reconhece que “grande parte da cobertura sobre o caso de Stella foi extremamente injusta”…

Após muitos cafés servidos, estreia na HBO o documentário Hot Coffee, em 27 de junho de 2011. Susan Saladoff dirige a série e relança a discussão sobre a necessidade de reforma do sistema americano de arbitramento de indenizações.

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Tramita no Congresso Nacional, sob acesos debates, o Projeto de Lei 5.196/2013, que propõe acrescentar o Capítulo VIII ao Título I da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e o parágrafo único ao art. 16 da Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais).

Conforme consta das considerações apresentadas em conjunto pelo Ministro da Justiça e pelo Advogado-Geral da União, “o objetivo da medida é conferir maior efetividade e eficácia às decisões das autoridades administrativas de defesa do consumidor, em especial dos PROCONs, para que, além da aplicação de multas, possam estabelecer medidas corretivas aos fornecedores que incorram em infrações aos direitos dos consumidores. Outro objetivo é permitir que as conclusões das audiências realizadas pelas autoridades administrativas de defesa do consumidor possam ser utilizadas pelos Juizados Especiais, evitando-se duplicidade de procedimentos e garantindo maior agilidade”.

A proposta prevê a criação do art. 60-A, conferindo à autoridade administrativa o poder de aplicar “medidas corretivas”, como a substituição ou reparação do produto; a devolução da contraprestação paga pelo consumidor mediante cobrança indevida, o cumprimento da oferta apresentada pelo fornecedor e a devolução de quantia paga pelo consumidor. O projeto de lei ainda versa sobre a possibilidade da aplicação de multa diária, revertida aos fundos de proteção ao consumidor.

Também se depreendem do texto em discussão duas estratégias para encurtar a peregrinação do consumidor pelos tortuosos caminhos do Judiciário: uma está no protótipo do art. 60-B do Código de Defesa do Consumidor, dotando “as decisões administrativas que apliquem medidas corretivas” do caráter de título executivo extrajudicial. A outra pretende prover o art. 16 da Lei dos Juizados Especiais de um parágrafo único, com o qual o pedido instruído com o termo da audiência de conciliação frustrada no órgão consumerista importará na imediata designação de audiência de instrução e julgamento.

As principais censuras que o projeto tem sofrido dizem respeito à inconstitucionalidade da atribuição a órgãos consumeristas e, portanto, parciais, sem estrutura técnica ou preparo jurídico, de poderes próprios de autoridades judiciais. Estaria ferida a “reserva de jurisdição”.

Alguns congressistas lembraram que, por recomendação do Ministério da Justiça, a intenção de qualificar a decisão dos PROCONs como título executivo extrajudicial foi vetada pelo Presidente da República na ocasião em que sancionou o Código de Defesa do Consumidor, em 1990 (art. 82, § 3º). Ainda assim se admite ao compromisso de ajustamento de conduta a eficácia de título executivo extrajudicial (REsp 222.582, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, julgamento em 12/03/2002, Primeira Turma do STJ, DJ de 29/04//2002).

Até então, o fruto que se pode colher é o reconhecimento da lentidão do Poder Judiciário na resolução de conflitos simples, na sua maioria, e da necessidade de se implementar, efetivamente, um sistema de harmonização das relações de consumo.

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1988. É promulgada a nova Constituição da República Federativa do Brasil. A quarta Carta Magna mais extensa de leis no mundo. Centenas de artigos e diversas emendas. A Inglaterra não tem Constituição escrita. A justiça inglesa se baseia em princípios e antigas cartas de direitos. No Reino Unido, pouco vai parar nos Tribunais. Apenas questões extremamente importantes são levadas ao Poder Judiciário. Na prática, as relações conflituosas são dissolvidas amigavelmente e, por regra, através dos órgãos estatais reguladores e fiscalizadores.

A nossa foi muito bem desenhada e protege todas as garantias e direitos fundamentais do cidadão.

Após um período de ditadura, em que direitos não existem, normal e natural que os constituintes não deixassem ralos abertos. E as frestinhas foram fechadas com as milhares de leis infraconstitucionais em todas as esferas legislativas. O nosso ordenamento jurídico prevê uma infinidade de sanções e punições para esse grande universo de condutas ilícitas. Somos um país farto em leis.

Os direitos, com o processo de redemocratização, promoveram, louvavelmente, um elevado grau de consciência e cidadania. Era preciso e necessário.

A facilitação do acesso a justiça, aproximando o judiciário da sociedade, sobretudo daquela parcela populacional mais humilde, garantiu proteção legal ao cidadão numa escala geométrica.

A nossa Constituição, no seu quinto artigo, deixou bem claro que a lei não excluiria (excluirá), jamais, da apreciação do judiciário, lesão ou ameaça a direito.

Uma garantia clara, sólida e perfeita para o acesso a justiça de todos os cidadãos.

Os legítimos direitos do cidadão estavam, enfim, muito bem assegurados.

E dois anos após a promulgação da Constiuição, disciplinando o inciso XXXII do artigo 5º, nasce o importante Código de Defesa do Consumidor.

Era vital, numa sociedade em franca expansão econômica, que as relações de consumo fossem disciplinadas, reguladas e amparadas.

Rompia-se, definitivamente, a barreira das injustiças sociais. A porta do judiciário estava franqueada para todos.

Os efeitos colaterais.

Surge, contudo, a cultura da litigiosidade para todo tipo de relação conflituosa. Todo litigio, sem grau nenhum de nocividade social, é judicializado.

A resolução dos conflitos extrajudicialmente são desprezados pelas partes e pelos seus próprios advogados. O acordo fica fora do cenário jurídico como a melhor e mais eficiente forma de resolver o conflito, para dar lugar as grandes expectativas das generosas indenizações.

E a clientela do judiciário começa a crescer e alcança números inadministráveis. O esbarrão e o pisão no pé tornam-se acidentes sociais intoleráveis.

As prateleiras do Poder Judiciário começam a inflar.

Uma espécie de “eldorado” das demandas indenizatórias se instala em todas as camadas da Justiça, que precisa expandir seus territórios para atender as mais anacrônicas e exóticas questões.

Nasce o abuso desenfreado das garantias constitucionais de acesso à justiça, com ações de toda natureza, moralmente absusivas e que estão fora da curva de atuação e importância do Poder Judiciário. É o uso imoderado na nossa justiça.

Perde-se, totalmente, a noção da competência de provocação do Poder Judiciário.

Os pequenos “ilícitos”, antes de chegarem ao judiciário, deixam de considerar e refletir sobre a existência real de nocividade e gravidade da conduta, tida como efetivamente perniciosa à convivência social.

O conceito de bem jurídico, importante e que merece a tutela do Estado, perde o “status”da relevância e aparece travestido de uma rusga social com a casca fina de ação judicial.

A valiosa atividade do Estado, através do Poder Judiciário, perde-se no tempo e espaço, em conceito e forma, para resolver conflitos caseiros.

O Estado Intervencionista.

A força do Estado, democrático e guardião dos direitos, deveria trabalhar, sensivelmente, com o princípio da intervenção mínima, considerando sempre, nessa reflexão de “longa manus”, que os efeitos do conflito social sejam negativos, agindo apenas quando no seu dever de regular e disciplinar a vida em sociedade.

E a partir desse princípio, as partes em conflito, antes, deveriam provar que esgotaram todas as formas e tentativas de obter a resolução amigável através dos canais administrativos.

Defendo aqui essa polêmica posição, já que os números de ações judiciais, segundo o Conselho Nacional de Justiça, alcaraçaram índices estratosféricos. Estamos próximos dos cem milhões de ações judiciais. E as demandas crescem a cada ano. O número de respostas já não consegue acompanhar o de entradas. O judiciário está enxugando gelo diariamente.

É algo, pelo tamanho da justiça brasileira, inadministrável. Não se pode esperar, com esses números, que a justiça seja plena e justa em todos os seus contornos.

O Judiciário é para ser provocado em última instância, quando absolutamente necessário.

A manifestação enérgica do Estado deve, sempre, ser suscitado quando não for possível outro meio menos gravoso e custoso. Quando outros caminhos, menos dolorosos, já não mais forem possíveis e acessíveis, no âmbito civil ou administrativo.

Creio que a proteção jurídica deve obedecer certos limites, impondo freios rápidos, sob pena da banalização total do nosso sistema judiciário.

Em São Paulo, para uma pequena ideia da nossa realidade, segundo matéria publicada no Jornal O Globo, em abril de 2014, um único juiz acumula 310.000 processos em seu gabinete.

Vivemos, no Brasil, um perigoso processo de hiperlitigiosidade.

Tudo está sendo despejado dentro do Judiciário. Disputas insanas por centavos e pedaços de papel sem valor.

O momento, portanto, para que o judiciário realmente cuide de questões importantes e vitais para a ordem democrática e social, é a de rever alguns conceitos, inclusive dentro do próprio Poder Judiciário, cuja atuação deve oferecer mais rigor contra as ações oportunistas e cheias de máscaras.

Talvez, penso, dar alguns passos para trás em busca do ponto de equilíbrio ideal.

O Judiciário não pode continuar tomando para si, questões, por exemplo, fora dos limites de intervenção do Estado.

A cultura da judicialização fácil, que se criou no Brasil, precisa de travões.

A resolução dos conflitos, numa sociedade moderna, de forma amigável e espontânea, fora dos corredores judiciais, também é um ato de cidadania.

Em outra instância, menos gravosa e custosa para o Estado, sugerimos a utilização dos órgãos administrativos de resolução dos conflitos, através da mediação e arbitragem.

Se assim não for, logo, os processos realmente importantes perderão em qualidade e efetividade.

A justiça deve existir para os que buscam justiça. Justiça consciente. Justiça deve ser dada para os justos.

A sociedade precisa refletir.

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