Faltou juízo?

Faltou juízo?

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A crise hídrica é muito mais grave do que possa parecer. Em 1991, às vésperas da Eco-92, o sistema Cantareira já mostrava sinais de exaustão. São Paulo tentou normatizar o uso adequado da água, erigindo a bacia hidrográfica a parâmetro de atuação. Mas como tudo acontece nesta República, há um longo caminho entre a lei e sua observância.

A cultura da abundância leva a imensa maioria das pessoas a acreditar que água é gratuita e infinita. Só que ela é finita e seu tratamento custa mais caro a cada minuto. Sem água não se vive. Ainda assim, perseverou-se na ignorância e na insensatez. Um Tietê que nasce límpido em Salesópolis, se torna morto e assim permanece por 71 km, desde Guarulhos até Pirapora do Bom Jesus. Em todas as cidades civilizadas, o Rio é fonte de vida.

Serve para abastecer a população, para transportar pessoas, para abastecê-las de pescado, para embelezar o ambiente. Aqui em São Paulo, o Tietê é um transporte considerado gratuito de esgoto doméstico, efluentes tóxicos despejados pelas indústrias inconscientes, pestilência de toda a ordem oriunda da sujeira que caracteriza grande parte das periferias, conduto para os resíduos sólidos que a ignorância produz.

Não é incomum ver móveis, geladeiras, carcaças de automóveis, animais mortos e outras imundícies que a inclemência do bicho homem lança àquilo que deveria ser renovação permanente da vitalidade. Sem água não se vive, ao contrário do petróleo. Água deveria custar mais do que gasolina, etanol e diesel. Para uma população que não tem noção exata do que acontece, onerar o bolso representaria sinal de alerta, a anteceder a emergência que virá.

É urgente conscientizar as pessoas de que derrubar árvores é sinônimo de matar a humanidade. Já passou a hora de incutir nas crianças o desejo de replantar a vegetação criminosamente abatida, que gerou a desertificação. Ainda haverá tempo para coibir as maldades praticadas contra a natureza, levar a sério a legislação tutelar da ecologia, punir infratores, sejam pessoas físicas, empresas ou o Poder Público e tomar consciência de que está em risco não a sobrevivência da espécie, mas as necessidades da próxima semana, do próximo mês e do ano que se avizinha?

Faltou e continua a faltar juízo. Haverá coragem para reverter esse quadro tétrico?

VIA Renato Nalini
Sou Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Docente universitário. Membro da Academia Paulista de Letras. Autor, entre outros, de Ética da Magistratura (2ª ed.), A Rebelião da Toga (2ª ed.) e Ética Ambiental (2ª ed.).

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