God Save The Good Judges

God Save The Good Judges

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Dizem que o exemplo vem de cima, mas lá em cima há Deus. Um Deus que não serve para o judiciário, que é laico, por instituição. Se Deus não existe, em tese, como Ser Maior, sobretudo no exercício da profissão, suponho que essa comparação não tenha força ou caráter de ironia. Há, aí, um conflito sociológico.

O magistrado violou toda a legislação de trânsito. Não gostou da abordagem. Agiu com a arrogância da qual o cargo não o investiu. A sociedade já repudia esse comportamento. É uma função pública, importante, mas como inúmeras outras.

O médico, quando opera uma cirurgia durante longas e cansativas horas, com enorme grau de risco, em um paciente entre a vida e a morte, poderia, analogicamente, se julgar um Deus, ou o próprio Deus?

O judiciário, dentro das nossas instituições, não goza de muito crédito na nossa sociedade. Está, salvo engano, em quarto lugar nesse aspecto, conforme pesquisa levada a efeito pela Fundação Getúlio Vargas em 2013. Está longe das instituições mais prestigiadas da República: Forças Armadas em primeiro, Igreja Católica em segundo e Ministério Público em terceiro.

A nossa Constituição, tida como a lei máxima para todos, diz que todos são iguais perante a lei. O magistrado em questão, cheio de infrações, estaria fora desse regramento maior?

E se o exemplo vem de cima, deveria o magistrado, diante dos seus compromissos e juramentos profissionais, dar o exemplo. Aliás, deveria parabenizar a outra funcionária pública. Elogiá-la pelo trabalho sério e bem feito. O Brasil, a propósito, sofre muito com a impunidade. Sofre com os funcionários públicos que não cumprem com o seu dever. Sofre com aquele velho jeitinho odioso de se resolver essas questões. O Brasil só vai avançar moralmente quando nossos representantes agirem com a força, correção e retidão para o qual são pagos pela sociedade.

Teremos nós, então, advogados, médicos, engenheiros, ou profissionais de outros segmentos, o direito de utilizar o bom nome de Deus para nos sentirmos ironizados? Não estamos, aqui, generalizando, de forma alguma. O Judiciário tem profissionais exemplares. O Judiciário, a propósito, é uma das mais importantes instituições de uma nação democrática. O Judiciário, como diz aquele velho ditado; “deve fazer o bem (o justo) sem olhar a quem”. O Judiciário é o guardião maior do destino da nossa nação. O STF, no inédito capítulo do mensalão, deu um dos maiores exemplos da sua soberania e independência total, política, partidária e ideológica. E é esse Judiciário que a sociedade quer ao seu lado.

Esse episódio, infeliz, revelou as mazelas nas nossas arrogantes instituições. Abriu-se mais uma janela, enorme, para que todos enxerguem sem lentes de grau, como a nossa sociedade é dividida.

A soberania popular está deixando de ser uma bazófia ou mero capítulo teórico da democracia. Os cidadãos querem tomar as rédeas da nação sem a necessidade de se infiltrarem nos centros de poder. Estão se sobrepondo à jurisdição para decidir segundo uma consciência coletiva, com eficácia superior, à medida que até mesmo arrecadam fundos para a compensação moral daqueles que consideram ser vítimas de injustiças.

Os grandes postulados iluministas estão ressurgindo no ativismo das redes sociais, a roupagem moderna e prática da expressão latina “vox populi, vox Dei” – a voz do povo é a voz de Deus! Nessa ordem pop-divina – desculpe o neologismo! -, os juízes são vassalos; devem agir como devotos cumpridores da vontade do povo.

Séculos se passaram, mas continuamos divididos por castas. Temos, de um lado, o dinheiro. Temos, de outro, os nomes familiares. Temos o status da profissão. E temos, também, a classe política.

Essa é a crença, hoje, que temos da sociedade em que vivemos. A pirâmide continua existindo.

God save the good judges.

Cito, por fim, o maior Poeta da Língua Portuguesa de todos os tempos.

“Tenho prazer em ser vencido quando quem me vence é a razão, seja quem for o seu procurador.” ( Fernando Pessoa).

Márcio Aguiar é Sócio Fundador do escritório Corbo, Aguiar e Waise Advogados Associados.

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